domingo, 15 de maio de 2011

Notícia de última hora...


Quando há cerca de um mês aqui me deixei levar por emoções cruéis no adeus a um amigo, não esperava que em pouco mais de 30 dias a vida se encarregasse de me esbofetear uma vez mais, com os mesmos trejeitos de malvadez e de sadismo... Um velho amigo, daqueles que desejamos perservar, não apenas porque achamos legitimado o egoísmo de o ter sempre junto a nós, mas sobretudo pela sua excepção enquanto ser humano, partiu este fim de semana, a tocar a sua guitarra portuguesa. Assim mesmo. Da forma que - arrisco - qualquer músico pretende acabar a estadia entre os vivos.
Sem falsos lirismos, e numa altura em que se enchem telejornais com as tricas e as troikas de politicos de trazer por casa, em que descubro sempre novas justificações para a demência do Jorge Jesus, em que me reinvento heroicamente para sobreviver num país pouco mais que ingrato, e em que me preparo psicologicamente para mais um assumo de ignorância e estupidez do Zé Povo no dia 5 de Junho, nessa mesma altura o meu amigo João tocava os seus últimos acordes na sua guitarra, com o sorriso de sempre e com a alegria que, derradeiramente, acamou nas doze cordas do mais belo instrumento musical do universo!
O país pouco se importou com isso (e não seria de esperar outra coisa), os sócretinos mais ou menos denunciados, alaranjados ou simplesmente rosas, distribuiam beijocas na ignóbil velharia que encheu autocarros e pavilhões, havia comentadores em horário nobre a quererem juntar ao rebanho os que não puderam ou quiseram entrar nos autocarros, e falava-se de "pesos pesados", "perdidos na tribo", nos números do euromilhões, no que se fazia com ele, ouvi até que o chefinho do FMI quis ter mais olhos que barriga com uma moçoila (mais ou menos com a mesma sangria de quando sentou as carnes por cá)...
Tudo se conjugou para mais uma enchurrada de entulho e podridão nas nossas vidas, enquanto tu partias, meu amigo. Não acordaste para contar aos teus as graçolas mais ou menos inspiradas do teu país, e mais uma vez dei por mim a equacionar o sentido da vida, a pô-lo à prova, em xeque, a tentar vislumbrar uma razão minimamente convincente para a tua precária saída de tudo isto. Em vão.
E a verdade, meu amigo, é que acordei para contar aos meus, não o desprezível quotidiano das 13h em ponto, mas a mais feroz de todas as notícias do dia: "O Chitas morreu!". Essa teria sido digna de abertura na voz da Clara de Sousa. Porém, a tua grandeza não se coaduna com a pequenez de quem teima em sê-lo, e preferimos, tu, eu e os "nossos", manter a discrição ditada pelo urbanismo da nossa canção e, ao longo de um eterno dia, não consegui desprender-me do teu sorriso de sempre.
Enchi um copo de vinho para te brindar. Fumei um cigarro contigo. Cantei para ti... Cantei por ti!
E tu sorriste... como sempre!