segunda-feira, 12 de setembro de 2011

"É como diz o outro"... São 32!


Não quis rambóias, festarolas mais ou menos embriagadas. Desta vez, preferi deixar o meu amado Alentejo antes de tempo e voltar à capital (actividade que tem ganho uma cadência anormal nos últimos tempos...). Precisei de me reunir comigo mesmo em altura de perceber que o envelhecimento precoce começa mesmo aos 30 e que, em dois anos, a velocidade das horas precipita-se, vertiginosamente.
Lisboa recebeu-me, nostálgica, sádica, como se o seu sorriso de Tejo me tapasse como um bébé antes de começar as travessuras. Deu-me a noite, um Fado Cravo sublime, deixou-me a sós, reunindo-me comigo mesmo, e quando mais precisei dela, voltou-me costas. Raios a partam!Uma vez mais, a minha reunião não teve consequências, e o escriba esqueceu-se da caneta para escrever a acta..
Houve o colo de dois amigos dos "tais", dos que sabem que nao é preciso chamá-los, e por ali se alimentaram histórias, nostalgias e sonhos, muitos sonhos. A noite de sono tornou-se transtorno, tentei durante esse período um novo encontro, mas rapidamente me deixei ir embora...
Miguel Guilherme e Bruno Nogueira foram os anfitriões do meu apoteótico regresso ao Teatro. "É Como Diz o Outro" (recomendo vivamente) deixou-me os maxilares à beira do desmoronamento, e durante uma hora e meia, partilhei gargalhadas genuinas, num espaço onde quse tudo ficou lá fora, e em que me tornei "eu". Foi a prenda que mereci, que me impus, e foi tão bonito regressar a ti...Houve algo de mágico a espalhar-se que não sei nem quero tentar explicar...
Lisboa revelou então uma face desconhecida de mim, uma candura única que me deixou encontrar-me ao longo da noite, coerentemente, desprezando o passar das horas e os consecutivos telefonemas que inundavam os telefones para dar a beijoca e o abraço dos "32". Urgiu algo mais importante, determinante, o mais significativo capítulo de uma vida. Foi bom renegar a tecnologia, foi bom sorrir, abrir o coração, foi profundamente bom. A magia do momento diluiu frustrações e revoltas, alimentou ilusões, e o Tejo - ali ao lado - deixou que a lua cheia furasse o breu, e a muralha com que tenho construído um "castelo" finalmente vulnerável, susceptível e à mercê da vida... A reunião correu bem, foi a primeira a ter direito a acta, gostei do encontro, e ainda por cima, no dia em que comecei a entender o envelhecimento. Foi bom cortar as amarras e deixar apenas as águas fazerem o seu trabalho. Foi importante a minha velha Lisboa. Houve o brilho no olhar, os trejeitos da ingenuidade, a partilha, o entendimento, o mistério, e "aquele" sorriso, e houve um dia de aniversário diferente de todos os outros 31... Singular, reconfortante como nenhum outro, e belo, profundamente belo...
A unicidade do dia fica eternizada numa linda foto a preto e branco que roubei e ofereci... Ilumina-me dias e alma.
Obrigado...

domingo, 15 de maio de 2011

Notícia de última hora...


Quando há cerca de um mês aqui me deixei levar por emoções cruéis no adeus a um amigo, não esperava que em pouco mais de 30 dias a vida se encarregasse de me esbofetear uma vez mais, com os mesmos trejeitos de malvadez e de sadismo... Um velho amigo, daqueles que desejamos perservar, não apenas porque achamos legitimado o egoísmo de o ter sempre junto a nós, mas sobretudo pela sua excepção enquanto ser humano, partiu este fim de semana, a tocar a sua guitarra portuguesa. Assim mesmo. Da forma que - arrisco - qualquer músico pretende acabar a estadia entre os vivos.
Sem falsos lirismos, e numa altura em que se enchem telejornais com as tricas e as troikas de politicos de trazer por casa, em que descubro sempre novas justificações para a demência do Jorge Jesus, em que me reinvento heroicamente para sobreviver num país pouco mais que ingrato, e em que me preparo psicologicamente para mais um assumo de ignorância e estupidez do Zé Povo no dia 5 de Junho, nessa mesma altura o meu amigo João tocava os seus últimos acordes na sua guitarra, com o sorriso de sempre e com a alegria que, derradeiramente, acamou nas doze cordas do mais belo instrumento musical do universo!
O país pouco se importou com isso (e não seria de esperar outra coisa), os sócretinos mais ou menos denunciados, alaranjados ou simplesmente rosas, distribuiam beijocas na ignóbil velharia que encheu autocarros e pavilhões, havia comentadores em horário nobre a quererem juntar ao rebanho os que não puderam ou quiseram entrar nos autocarros, e falava-se de "pesos pesados", "perdidos na tribo", nos números do euromilhões, no que se fazia com ele, ouvi até que o chefinho do FMI quis ter mais olhos que barriga com uma moçoila (mais ou menos com a mesma sangria de quando sentou as carnes por cá)...
Tudo se conjugou para mais uma enchurrada de entulho e podridão nas nossas vidas, enquanto tu partias, meu amigo. Não acordaste para contar aos teus as graçolas mais ou menos inspiradas do teu país, e mais uma vez dei por mim a equacionar o sentido da vida, a pô-lo à prova, em xeque, a tentar vislumbrar uma razão minimamente convincente para a tua precária saída de tudo isto. Em vão.
E a verdade, meu amigo, é que acordei para contar aos meus, não o desprezível quotidiano das 13h em ponto, mas a mais feroz de todas as notícias do dia: "O Chitas morreu!". Essa teria sido digna de abertura na voz da Clara de Sousa. Porém, a tua grandeza não se coaduna com a pequenez de quem teima em sê-lo, e preferimos, tu, eu e os "nossos", manter a discrição ditada pelo urbanismo da nossa canção e, ao longo de um eterno dia, não consegui desprender-me do teu sorriso de sempre.
Enchi um copo de vinho para te brindar. Fumei um cigarro contigo. Cantei para ti... Cantei por ti!
E tu sorriste... como sempre!

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Cruel este adeus que não sei dizer!

A vida ocupou-se de me dar mais uma bofetada durante a tarde de hoje. Ao fim de anos de encontros e desencontros, de partidas, de sapos engolidos, sorrisos amarelos, azedos, a vida chicoteou-me a alma da mais cruel das formas e trouxe-me de volta à lembrança as piores e mais marcantes imagens.

Hoje lembrei-me da morte, do adeus aos meus avós, a alguns amigos que partiram cedo demais, lembrei-me da angustiante e indescritível imagem do meu irmão a desafiar o destino (foi há 14 anos e não há um dia que não recorde esse malfadado dia de Julho!), e deixei-me mergulhar numa melancolia chorosa, agreste e suplicada. Lembrei-me do quão fraco e fugaz sou quando me confronto com a mais elementar lei da natureza. E fiquei triste, senti-me mais triste que o Fado Menor, mais só e desamparado que uma criança perdida. Quedei-me a um abismo desconhecido que, sem discussão, me visitará sem hora marcada na agenda.

A sorte de um sol esplendoroso esgotou-se ao entrar na sala. Lá estava ele, prostrado, magro como um cão vadio, com as cores desmaiadas, olhar fixo, esbugalhado, clemente. A vida já morre dentro daquelas quatro paredes, e a brutalidade da imagem sente-se à flor da pele, como se o anúncio do fim gargalhasse ecoando nos meus ouvidos. Não me aguentei muito tempo, não consegui cinco minutos de coragem e estoicismo perante tão indizível e negro quadro. A sensação de impotência e de frustração tomou-me sem autorização prévia, arrebatando-me e levando-me a um desespero envergonhado que derramei já na rua, sozinho, em dois cigarros de enfiada...

Hoje, como ontem, custa-me dizer "adeus". Nunca o soube fazer com a elegância de Humphrey Bogart, teimo em não ceder ao convencional aceno, ao beijo e ao abraço. Falta-me sempre algo mais, falta-me engenho para rejeitar esta secura que é minha, este desapego espiritual que certamente me ajudaria no processo. E, mais uma vez, escondo-me no meu choro envergonhado e só... Quis ser eu naquela cama, quis que fosse ele a chorar, e não eu! Se a puta da morte tivesse cara, esmurrá-la-ia, hoje, com cadência infindável, bárbara e desenfriada!

Hoje, pela primeira vez, despedi-me de um amigo a quem escasseia sofregamente a vida.

Hoje, uma vez mais, chorei genuinamente.

Hoje, como sempre, não entendo...


ps. Este texto é dedicado aos que mais gosto e que me deixaram. Às minhas avós Joana e Maria, ao meu avô José que não cheguei a conhecer, ao meu inspirador avô Amadeu, ao meu amigo Dinis (que teve a coragem de se zangar com este país e partir, eu sei que sentirás as minhas palavras), ao Mascarenhas, e a tantos outros... e é invariavelmente dedicado ao meu amigo Joaquim Catita, a quem a estúpida morte já lhe sussurrou o fim.

Custou-me tanto, mas tanto, despedir-me de ti, meu amigo! Estarás sempre em cada Fado meu!... até à (minha) finitude física. Porque hoje morri um pouco mais...

segunda-feira, 11 de abril de 2011

"Ajuda externa" para brincarmos todos juntos!



Depois de ao fim de 31 anos não me cansar de ouvir o meu pai a desfazer-se em diatribes a cada aparição televisiva do Sr. Soares, constato que a socialice rosa mantém a bitola a um nível pouco ou nada recomendado. Depois de Governadores do Banco de Portugal, apologistas da privatização, cortadores de benefícios laborais e sociais (conquistados, não em Abril, mas nas revoluções do séc. XIX!), tecnocratas e descarados agiotas, surge ainda um engenheiro de fim de semana armado em salvador de uma pátria que há muito o deixou de ser.

Este é o país que se orgulha dos cravos sem sangue mas que o derrama, com sádica passividade, nas trincheiras de quem realmente luta no dia a dia para, pelo menos, salvar a dignidade possível. Culpar os mais mal pagos e mais explorados pela "falta de produtividade" e pela "tanga" é, no mínimo, irresponsável, mas permitam-me que acrescente mimosos adjectivos como sacana, nojento, vil e desprezível.

Trazer-se o FMI para ajudar a "salvar" o que resta é, em suma, o coroar da desonra com que esta canalha se emancipou das saias da mãe para brincar com os seus (boys) amigos aos ricos e aos pobres, arranjando para isso, brinquedos como bancos privados que são pagos pelo público, aeroportos e comboios de alta velocidade que ainda não arranjaram poiso fixo enquanto se afere quantos (boys) amigos poderão ganhar mais uns euritos com as expropriações... Até lá, o recreio continua, ainda que os "professores" façam alguns avisos, em vão. A rapaziada está energicamente entregue ao jogo, sem pausas para sandes e laranjadas, e com consecutivas vitórias, a ambição desmede-se a cada segundo...

É neste contexto que o altruísta FMI vai também ele sentar as carnes em cima do Zé Povo, com direito a flatulência e tudo! Caricato é parte do Zé ainda imberbe se fiar na Nossa Senhora e nestes estarolas e acreditar que a tão afamada "ajuda externa" sê-lo-á, na verdade. Mais, caricato é ver a alternativa "coelhina" cada vez mais inchada de bazófia e que não enjeita pegar nos dados para jogar um bocadinho. Diz que é a sucessão. Eu digo que será, para começar, a continuação. É que passado o tempo de adaptação (qual jogador da bola argentino!), a versão "orangina" do Sr. Engenheiro estará em pleno no tabuleiro e surpreendendo ou não o Zé Povo menos deslumbrado, "contratou" um reforço de peso para a jogatana ao "pote", o tal Nandinho que salvou vidas no Senegal e que estava farto da política partidária...

A festa continua, e agora juntam-se a nós, em jeito de intercâmbio, a malta fixe da UE e do Fundo. Como diria o Zeca (e ainda bem para ele que já não assiste a isto!), "traz um amigo também". Afinal de contas, o Zé Mário Branco, no Inverno de 1979, também estava a brincar quando escreveu o FMI ("consolida, filho, consolida!"), afinal o que a malta quer é ser animada... E no meio de tudo isto, ainda se chama "intervenção" a dois tipos vestidos à 70's ou a uma Deolinda que diz que é parva. A brincadeira, pelos vistos, começa cá por baixo, num grotesco analfabetismo cultural de um Zé Povo que teima em não aprender, em não votar, em não ser Povo... Talvez por se sentir atónito e sufocado pelas nalgas de quem se sentou e senta em cima dele? Talvez. Mas não só...

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

"Parvo és tu que vais votar"


Se dúvidas ainda houvesse sobre em quem votar nesta contagem decrescente para mais uma destacada posição de miserabilidade do povo português, as televisões encarregam-se de esclarecer os mais atentos com sucessivas aparições dos "ilustres" beneméritos candidatos a perpetuar a pátria lusa tal como a conheço.
Falo em miserabilidade do Zé Povo, do ponto de vista de uma abstenção que se adivinha, no mínimo, anedótica. Creio que a ignorância se mescla muitas vezes com a estupidez natural de um Zé que ainda não interiorizou que a posição "Eu não confio em nenhum, não vou votar!" não é mais que um acto único de leviandade pouco mais que parola e que, em abono da verdade, não define posição nem tão pouco opinião. Bonito e original seria ver os vários candidatos, unidos, numa campanha de alfabetização em pleno horário nobre explicando ao Zé o significado da expressão "voto em branco"...
Mas não será sequer provável. Em vez disso, angustiar-nos-emos mais uma semana com a cadavérica presunção vencedora de Cavaco sorrindo, estático, a cada interpelação sobre o BPN, e com a nostalgia do Maio de 68 de um Alegre poeta com ataques de pânico quando se fala do BPP. Nobre medicina uma simpatia unânime mas descolorida, Moura é Defensor ainda não percebi bem do quê, o PCP lança para a corrida mais um dos nomes que ninguém se lembrará em Fevereiro (eu já tenho dificuldade em lembrar-me), e no meio de tudo isto, ainda temos um destemido madeirense a animar as hostes e, com efeito, a divertir o Zé Povo.
O circo está montado para mais um Domingo de festa e de passeios pelo Colombo, para orgulhosos democratas e faminta populaça ansiosa pelas 19h para saber das projecções. Portugal não vai parar, nem de perto nem de longe, até porque para mal dos pecados de muitos milhões, o Benfica não jogará certamente nesse dia. Logo, a ténue percentagem de cidadãos que levantar o nalguedo do sofá para perder 5 minutos e dobrar o boletim, será na manhã do dia 24, motivo de chacota pela larga franja de Josés e de Marias que acrescentarão ao "Não confio em nenhum, não vou votar", a provável terminação: "Parvo(a) és tu que ainda foste votar!".
E, no meio deste pestilento lamaçal de párias, ainda há quem se ofenda com a hipotética candidatura de Manuel João Vieira! Permitam-me uma brejeirice sulista: "Haviam de levar com um gato morto pelas ventas até ele miar!"... (pobre gato)